p> Hoje em dia, as emoções são tão negligenciadas que a maior parte das pessoas são alheias às correntes profundas que as movem, as retêm, e as desviam.
Se eu disser, “estou grato”, poderia significar uma de três coisas: que estou actualmente a sentir-me grato por algo, que estou geralmente grato por essa coisa, ou que sou um tipo de pessoa grato.
Simplesmente, se eu disser, “estou orgulhoso”, poderia significar que estou actualmente a sentir-me orgulhoso de algo, que estou geralmente orgulhoso daquela coisa, ou que sou um tipo de pessoa orgulhosa.
Deixe-nos chamar à primeira instância (actualmente a sentir orgulho em algo) uma experiência emocional, à segunda instância (estar geralmente orgulhoso dessa coisa) uma emoção ou sentimento, e à terceira instância (ser uma pessoa orgulhosa), uma característica.
É muito comum confundir ou amalgamar estas três instâncias, especialmente a primeira e a segunda. Mas enquanto uma experiência emocional é breve e episódica, uma emoção – que pode ou não resultar de experiências emocionais acrescidas – pode durar muitos anos, e, nesse tempo, predispor a uma variedade de experiências emocionais, bem como pensamentos, crenças, desejos e acções.
Por exemplo, o amor pode dar origem não só a sentimentos amorosos, mas também a alegria, tristeza, raiva, desejo, e ciúme, entre outros.
Similiarmente, é muito comum confundir emoções e sentimentos. Uma experiência emocional, em virtude de ser uma experiência consciente, é necessariamente um sentimento, tal como sensações físicas como a fome ou a dor (embora nem todas as experiências conscientes sejam também sentimentos, não, por exemplo, acreditar ou ver, presumivelmente por falta de uma dimensão somática ou corporal).
em contraste, uma emoção, estando de certa forma latente, só pode ser sentida, sensu stricto, através das experiências emocionais a que dá origem, mesmo que também possa ser descoberta através dos seus pensamentos, crenças, desejos e acções associados.
Apesar destas manifestações conscientes e inconscientes, as emoções não precisam de ser elas próprias conscientes, e algumas emoções, tais como odiar a mãe ou estar apaixonado pelo melhor amigo, só podem ser descobertas, quanto mais admitidas, após vários anos em psicoterapia.
Se uma emoção permanece inconsciente, isto é frequentemente através de repressão ou alguma outra forma de auto-engano. É claro que a auto-engano também pode ocorrer ao nível de uma experiência emocional se esta não for aceitável ou tolerável, por exemplo, atribuindo mal o tipo ou intensidade da experiência emocional, ou atribuindo mal o seu objecto ou causa. Assim, a inveja é frequentemente interpretada como indignação, e Schadenfreude (o prazer derivado do infortúnio dos outros) como simpatia. O medo de fantasmas ou ‘a escuridão’ é quase certamente o medo da morte, uma vez que as pessoas que se conformaram com a morte dificilmente têm medo de tais coisas.
Além disso, poder-se-ia argumentar que mesmo a mais pura das emoções é inerentemente auto-enganosa, na medida em que empresta peso na nossa experiência a uma coisa, ou algumas coisas, sobre outras. Nessa medida, as emoções não são percepções objectivas ou neutras, mas ‘formas de ver’ subjectivas que reflectem as nossas necessidades e preocupações.
Neel Burton é autor de Heaven and Hell: A Psicologia das Emoções e outros livros.
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